Reflexões à luz de grandes pensadores da humanidade
Crise
cultural e transformações sociais - O ponto
de mutação
Fritjof Capra, 1982
Quando falamos que vivemos atualmente
uma crise cultural, com a destruição de valores e costumes, e com o surgimento
de novas formas de viver no mundo, temos a sensação de que isso é um fenômeno do
nosso tempo e de que vivemos transformações nunca antes vista na história das
sociedades.
Fritjof Capra, no livro “O ponto de
mutação”, de 1982, um trabalho belíssimo e de agradável leitura, nos mostra uma
visão de mundo como um sistema vivo, onde tudo é interligado e que, para
vivermos melhor e para agirmos melhor nesse mundo, precisamos não apenas
construir pontos de vistas isolados ou focados em apenas uma forma de enxergar
o mundo, mas sim, precisamos construir uma visão holística do mundo, onde, o
mais importante de tudo, é a nossa percepção da realidade e do mundo, porque,
disso depende a nossa atuação.
Um pequeno trecho retirado do livro,
apresentado no texto a seguir, nos mostra que as sociedades e as civilizações
vivem em constantes mudanças, e que essas mudanças seguem um padrão – sempre que
as sociedades tornam-se inflexíveis e incapazes de absorverem o novo, é hora de
transformações que mudem os paradigmas e que novas formas de enxergar e de
viver no mundo se faz necessário.
Aprecie com atenção o texto abaixo.
Boa leitura.
Crise
cultural e transformações sociais
O ponto
de mutação,
Fritjof Capra, 1982
“Para entender nossa multifacetada
crise cultural, precisamos adotar uma perspectiva extremamente ampla e ver a
nossa situação no contexto da evolução cultural humana. Temos que transferir
nossa perspectiva do final do século XX para um período de tempo que abrange
milhares de anos; substituir a noção de estruturas sociais estáticas por uma
percepção de padrões dinâmicos de mudança. Vista desse ângulo, a crise apresenta-se
como um aspecto da transformação. Os chineses, que sempre tiveram uma visão
inteiramente dinâmica do mundo e uma percepção aguda da história, parecem estar
bem cientes dessa profunda conexão entre crise e mudança. O termo que eles usam
para "crise", wei-ji, é composto dos caracteres: "perigo" e
"oportunidade".
Os sociólogos ocidentais confirmaram
essa intuição antiga. Estudos de períodos de transformação cultural em várias
sociedades mostraram que essas transformações são tipicamente precedidas por
uma variedade de indicadores sociais, muitos deles idênticos aos sintomas de
nossa crise atual. Incluem uma sensação de alienação e um aumento de doenças
mentais, crimes violentos e desintegração social, assim como um interesse maior
na prática religiosa; tudo isso foi também observado em nossa sociedade na
década passada. Em tempos de mudança cultural histórica, esses indicadores
tendem a manifestar-se de uma a três décadas antes da transformação central,
aumentando em freqüência e intensidade à medida que a transformação se
avizinha, e novamente declinando após sua ocorrência.
As transformações culturais desse
gênero são etapas essenciais ao desenvolvimento das civilizações. As forças
subjacentes a esse desenvolvimento são complexas, e os historiadores estão
longe de elaborar uma teoria abrangente da dinâmica cultural; mas parece que
todas as civilizações passam por processos cíclicos semelhantes de gênese,
crescimento, colapso e desintegração.
Depois de atingirem o apogeu de
vitalidade, as civilizações tendem a perder seu vigor cultural e declinam. Um
elemento essencial nesse colapso cultural, segundo Toynbee, é a perda de
flexibilidade. Quando estruturas sociais e padrões de comportamento tornam-se
tão rígidos que a sociedade não pode mais adaptar-se a situações cambiantes,
ela é incapaz de levar avante o processo criativo de evolução cultural. Entra
em colapso e, finalmente, desintegra-se. Enquanto as civilizações em crescimento
exibem uma variedade e uma versatilidade sem limites, as que estão em processo
de desintegração mostram uniformidade e ausência de inventividade. A perda de
flexibilidade numa sociedade em desintegração é acompanhada de uma perda geral de
harmonia entre seus elementos, o que inevitavelmente leva ao desencadeamento de
discórdias e à ruptura social.
Entretanto, durante o doloroso
processo de desintegração, a criatividade da sociedade — sua capacidade de
resposta a desafios — não se acha completamente perdida. Embora a corrente
cultural principal tenha se petrificado após insistir em idéias fixas e padrões
rígidos de comportamento, minorias criativas aparecerão em cena e darão prosseguimento
ao processo de desafio-e-resposta. As instituições sociais dominantes recusar-se-ão
a entregar seus papéis de protagonistas a essas novas forças culturais, mas
continuarão inevitavelmente a declinar e a desintegrar-se, e as minorias
criativas poderão estar aptas a transformar alguns dos antigos elementos,
dando-lhes uma nova configuração. O processo de evolução cultural continuará
então, mas em novas circunstâncias e com novos protagonistas.
Ao observarmos a natureza dos nossos
desafios — não os vários sintomas de crise, mas as mudanças subjacentes ao
nosso meio ambiente natural e social —, podemos reconhecer a confluência de
diversas transições. Algumas delas estão relacionadas com os recursos naturais,
outras com valores e idéias culturais; algumas são partes de flutuações
periódicas, outras ocorrem dentro de padrões de ascensão-e-queda. Cada um
desses processos tem uma periodicidade distinta, mas todos eles envolvem
períodos de transição que acontece estarem coincidindo no presente momento.
Entre essas transições existem três que abalarão os alicerces de nossas vidas e
afetarão profundamente o nosso sistema social, econômico e político.
A primeira transição, e talvez a mais
profunda, deve-se ao lento, relutante, mas inevitável declínio do patriarcado.
A periodicidade associada ao patriarcado é de, pelo menos, três mil anos, um
período tão extenso que não podemos dizer se estamos diante de um processo
cíclico ou não, pois são mínimas as informações de que dispomos acerca das eras
pré-patriarcais. O que sabemos é que, nestes últimos três mil anos, a
civilização ocidental e suas precursoras, assim como a grande maioria das
outras culturas, basearam-se em sistemas filosóficos, sociais e políticos
"em que os homens — pela força, pressão direta, ou através do ritual, da
tradição, lei e linguagem, costumes, etiqueta, educação e divisão do trabalho —
determinam que papel as mulheres devem ou não desempenhar, e no qual a fêmea
está em toda parte submetida ao macho" O poder do patriarcado tem sido
extremamente difícil de entender por ser totalmente preponderante. Tem
influenciado nossas idéias mais básicas acerca da natureza humana e de nossa
relação com o universo — a natureza do "homem" e a relação
"dele" com o universo, na linguagem patriarcal. Era o único sistema
que, até data recente, nunca tinha sido abertamente desafiado em toda a
história documentada, e cujas doutrinas eram tão universalmente aceitas que
pareciam constituir leis da natureza; na verdade, eram usualmente apresentadas
como tal. Hoje, porém, a desintegração do patriarcado tornou-se evidente. O
movimento feminista é uma das mais fortes correntes culturais do nosso tempo, e
terá um profundo efeito sobre a nossa futura evolução.
A segunda transição, que terá um
profundo impacto sobre nossa vida, nos é imposta pelo declínio da era do
combustível fóssil. Os combustíveis fósseis * — carvão, petróleo e gás natural
— têm sido as principais fontes de energia da moderna era industrial, e, quando
se esgotarem, essa era chegará ao fim.
Numa ampla perspectiva histórica da
evolução cultural, a era do combustível fóssil e a era industrial são apenas um
breve episódio, um pico estreito em torno do ano 2000. Os combustíveis fósseis
estarão esgotados por volta de 2300, mas os efeitos econômicos e políticos
desse declínio já estão sendo sentidos. Esta década será marcada pela transição
da era do combustível fóssil para uma era solar, acionada por energia renovável
oriunda do Sol; essa mudança envolverá transformações radicais em nossos
sistemas econômicos e políticos.
Combustíveis fósseis
são resíduos de plantas fossilizadas — que foram enterradas na crosta da terra
e chegaram a seu atual estado através de reações químicas ocorridas durante
longos períodos de tempo.
A terceira transição também está
relacionada com valores culturais. Envolve o que hoje é freqüentemente chamado
de "mudança de paradigma'' * — uma mudança profunda no pensamento,
percepção e valores que formam uma determinada visão da realidade. O paradigma
ora em transformação dominou nossa cultura durante muitas centenas de anos, ao
longo dos quais modelou nossa moderna sociedade ocidental e influenciou
significativamente o resto do mundo. Esse paradigma compreende um certo número
de idéias e valores que diferem nitidamente dos da Idade Média; valores que estiveram
associados a várias correntes da cultura ocidental, entre elas a revolução científica,
o Iluminismo e a Revolução Industrial. Incluem a crença de que o método científico
é a única abordagem válida do conhecimento; a concepção do universo como um
sistema mecânico composto de unidades materiais elementares; a concepção da
vida em sociedade como uma luta competitiva pela existência; e a crença do progresso
material ilimitado, a ser alcançado através do crescimento econômico e
tecnológico. Nas décadas mais recentes, concluiu-se que todas essas idéias e
esses valores estão seriamente limitados e necessitam de uma revisão radical.”
Crise
cultural e transformações sociais - O ponto
de mutação
Fritjof Capra, 1982
Quando falamos que vivemos atualmente
uma crise cultural, com a destruição de valores e costumes, e com o surgimento
de novas formas de viver no mundo, temos a sensação de que isso é um fenômeno do
nosso tempo e de que vivemos transformações nunca antes vista na história das
sociedades.
Fritjof Capra, no livro “O ponto de
mutação”, de 1982, um trabalho belíssimo e de agradável leitura, nos mostra uma
visão de mundo como um sistema vivo, onde tudo é interligado e que, para
vivermos melhor e para agirmos melhor nesse mundo, precisamos não apenas
construir pontos de vistas isolados ou focados em apenas uma forma de enxergar
o mundo, mas sim, precisamos construir uma visão holística do mundo, onde, o
mais importante de tudo, é a nossa percepção da realidade e do mundo, porque,
disso depende a nossa atuação.
Um pequeno trecho retirado do livro,
apresentado no texto a seguir, nos mostra que as sociedades e as civilizações
vivem em constantes mudanças, e que essas mudanças seguem um padrão – sempre que
as sociedades tornam-se inflexíveis e incapazes de absorverem o novo, é hora de
transformações que mudem os paradigmas e que novas formas de enxergar e de
viver no mundo se faz necessário.
Aprecie com atenção o texto abaixo.
Boa leitura.
Crise
cultural e transformações sociais
O ponto
de mutação,
Fritjof Capra, 1982
“Para entender nossa multifacetada
crise cultural, precisamos adotar uma perspectiva extremamente ampla e ver a
nossa situação no contexto da evolução cultural humana. Temos que transferir
nossa perspectiva do final do século XX para um período de tempo que abrange
milhares de anos; substituir a noção de estruturas sociais estáticas por uma
percepção de padrões dinâmicos de mudança. Vista desse ângulo, a crise apresenta-se
como um aspecto da transformação. Os chineses, que sempre tiveram uma visão
inteiramente dinâmica do mundo e uma percepção aguda da história, parecem estar
bem cientes dessa profunda conexão entre crise e mudança. O termo que eles usam
para "crise", wei-ji, é composto dos caracteres: "perigo" e
"oportunidade".
Os sociólogos ocidentais confirmaram
essa intuição antiga. Estudos de períodos de transformação cultural em várias
sociedades mostraram que essas transformações são tipicamente precedidas por
uma variedade de indicadores sociais, muitos deles idênticos aos sintomas de
nossa crise atual. Incluem uma sensação de alienação e um aumento de doenças
mentais, crimes violentos e desintegração social, assim como um interesse maior
na prática religiosa; tudo isso foi também observado em nossa sociedade na
década passada. Em tempos de mudança cultural histórica, esses indicadores
tendem a manifestar-se de uma a três décadas antes da transformação central,
aumentando em freqüência e intensidade à medida que a transformação se
avizinha, e novamente declinando após sua ocorrência.
As transformações culturais desse
gênero são etapas essenciais ao desenvolvimento das civilizações. As forças
subjacentes a esse desenvolvimento são complexas, e os historiadores estão
longe de elaborar uma teoria abrangente da dinâmica cultural; mas parece que
todas as civilizações passam por processos cíclicos semelhantes de gênese,
crescimento, colapso e desintegração.
Depois de atingirem o apogeu de
vitalidade, as civilizações tendem a perder seu vigor cultural e declinam. Um
elemento essencial nesse colapso cultural, segundo Toynbee, é a perda de
flexibilidade. Quando estruturas sociais e padrões de comportamento tornam-se
tão rígidos que a sociedade não pode mais adaptar-se a situações cambiantes,
ela é incapaz de levar avante o processo criativo de evolução cultural. Entra
em colapso e, finalmente, desintegra-se. Enquanto as civilizações em crescimento
exibem uma variedade e uma versatilidade sem limites, as que estão em processo
de desintegração mostram uniformidade e ausência de inventividade. A perda de
flexibilidade numa sociedade em desintegração é acompanhada de uma perda geral de
harmonia entre seus elementos, o que inevitavelmente leva ao desencadeamento de
discórdias e à ruptura social.
Entretanto, durante o doloroso
processo de desintegração, a criatividade da sociedade — sua capacidade de
resposta a desafios — não se acha completamente perdida. Embora a corrente
cultural principal tenha se petrificado após insistir em idéias fixas e padrões
rígidos de comportamento, minorias criativas aparecerão em cena e darão prosseguimento
ao processo de desafio-e-resposta. As instituições sociais dominantes recusar-se-ão
a entregar seus papéis de protagonistas a essas novas forças culturais, mas
continuarão inevitavelmente a declinar e a desintegrar-se, e as minorias
criativas poderão estar aptas a transformar alguns dos antigos elementos,
dando-lhes uma nova configuração. O processo de evolução cultural continuará
então, mas em novas circunstâncias e com novos protagonistas.
Ao observarmos a natureza dos nossos
desafios — não os vários sintomas de crise, mas as mudanças subjacentes ao
nosso meio ambiente natural e social —, podemos reconhecer a confluência de
diversas transições. Algumas delas estão relacionadas com os recursos naturais,
outras com valores e idéias culturais; algumas são partes de flutuações
periódicas, outras ocorrem dentro de padrões de ascensão-e-queda. Cada um
desses processos tem uma periodicidade distinta, mas todos eles envolvem
períodos de transição que acontece estarem coincidindo no presente momento.
Entre essas transições existem três que abalarão os alicerces de nossas vidas e
afetarão profundamente o nosso sistema social, econômico e político.
A primeira transição, e talvez a mais
profunda, deve-se ao lento, relutante, mas inevitável declínio do patriarcado.
A periodicidade associada ao patriarcado é de, pelo menos, três mil anos, um
período tão extenso que não podemos dizer se estamos diante de um processo
cíclico ou não, pois são mínimas as informações de que dispomos acerca das eras
pré-patriarcais. O que sabemos é que, nestes últimos três mil anos, a
civilização ocidental e suas precursoras, assim como a grande maioria das
outras culturas, basearam-se em sistemas filosóficos, sociais e políticos
"em que os homens — pela força, pressão direta, ou através do ritual, da
tradição, lei e linguagem, costumes, etiqueta, educação e divisão do trabalho —
determinam que papel as mulheres devem ou não desempenhar, e no qual a fêmea
está em toda parte submetida ao macho" O poder do patriarcado tem sido
extremamente difícil de entender por ser totalmente preponderante. Tem
influenciado nossas idéias mais básicas acerca da natureza humana e de nossa
relação com o universo — a natureza do "homem" e a relação
"dele" com o universo, na linguagem patriarcal. Era o único sistema
que, até data recente, nunca tinha sido abertamente desafiado em toda a
história documentada, e cujas doutrinas eram tão universalmente aceitas que
pareciam constituir leis da natureza; na verdade, eram usualmente apresentadas
como tal. Hoje, porém, a desintegração do patriarcado tornou-se evidente. O
movimento feminista é uma das mais fortes correntes culturais do nosso tempo, e
terá um profundo efeito sobre a nossa futura evolução.
A segunda transição, que terá um
profundo impacto sobre nossa vida, nos é imposta pelo declínio da era do
combustível fóssil. Os combustíveis fósseis * — carvão, petróleo e gás natural
— têm sido as principais fontes de energia da moderna era industrial, e, quando
se esgotarem, essa era chegará ao fim.
Numa ampla perspectiva histórica da
evolução cultural, a era do combustível fóssil e a era industrial são apenas um
breve episódio, um pico estreito em torno do ano 2000. Os combustíveis fósseis
estarão esgotados por volta de 2300, mas os efeitos econômicos e políticos
desse declínio já estão sendo sentidos. Esta década será marcada pela transição
da era do combustível fóssil para uma era solar, acionada por energia renovável
oriunda do Sol; essa mudança envolverá transformações radicais em nossos
sistemas econômicos e políticos.
Combustíveis fósseis
são resíduos de plantas fossilizadas — que foram enterradas na crosta da terra
e chegaram a seu atual estado através de reações químicas ocorridas durante
longos períodos de tempo.
A terceira transição também está
relacionada com valores culturais. Envolve o que hoje é freqüentemente chamado
de "mudança de paradigma'' * — uma mudança profunda no pensamento,
percepção e valores que formam uma determinada visão da realidade. O paradigma
ora em transformação dominou nossa cultura durante muitas centenas de anos, ao
longo dos quais modelou nossa moderna sociedade ocidental e influenciou
significativamente o resto do mundo. Esse paradigma compreende um certo número
de idéias e valores que diferem nitidamente dos da Idade Média; valores que estiveram
associados a várias correntes da cultura ocidental, entre elas a revolução científica,
o Iluminismo e a Revolução Industrial. Incluem a crença de que o método científico
é a única abordagem válida do conhecimento; a concepção do universo como um
sistema mecânico composto de unidades materiais elementares; a concepção da
vida em sociedade como uma luta competitiva pela existência; e a crença do progresso
material ilimitado, a ser alcançado através do crescimento econômico e
tecnológico. Nas décadas mais recentes, concluiu-se que todas essas idéias e
esses valores estão seriamente limitados e necessitam de uma revisão radical.”
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